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Censura: Promotor de Justiça do Piauí processa cinco portais de notícias

A tensão entre o promotor e veículos locais começou depois que a justiça concedeu medida protetiva à ex-namorada do promotor

O promotor de Justiça Francisco de Jesus Lima, do Ministério Público do Estado do Piauí (MP-PI), processou cinco portais de notícias depois que os veículos divulgaram que ele foi alvo de medida protetiva por violência doméstica, em junho de 2019. A justiça revogou a medida um ano depois.

A tensão entre o promotor e veículos locais começou depois que a justiça concedeu medida protetiva à ex-namorada do promotor, que apresentou à Polícia Civil imagens de conversas e áudio de uma ligação telefônica que supostamente comprovariam a denúncia. As medidas não estavam sob segredo de justiça. À época, Lima integrava o Núcleo de Promotorias de Justiça de Defesa da Mulher Vítima de Violência Doméstica e Familiar (Nupevid).

Somente em 26.jun.2019, após a divulgação do caso, a defesa do promotor solicitou que o processo entrasse em sigilo para “preservação da vida e imagem dos envolvidos”.

O promotor entrou com ação judicial alegando danos morais contra os sites 180graus, Portal AZ, Portal OitoMeia, Cidade Verde e G1 Piauí. Os cinco processos exigem a exclusão das publicações e requerem indenizações que variam de 31 mil a 41,8 mil reais.

Foto: Divulgação

Em março de 2020, o promotor foi inocentado pelo Ministério Público Estadual, que arquivou o caso. Lima passou a processar os portais logo após o Tribunal de Justiça do Piauí revogar as medidas protetivas que se mantiveram até setembro do mesmo ano. O promotor alega que teve sua vida privada exposta de forma indevida e que sofreu abalos morais e psicológicos com a veiculação das matérias.

Em entrevista à Abraji, o editor-executivo do Portal OitoMeia, Allisson Paixão, afirmou ter acatado o acordo de retirada da publicação. “Tem coisas fogem do nosso controle como jornalistas. Foi uma orientação do advogado, e assim fizemos”. O Cidade Verde também fez acordo judicial e retirou a notícia do ar. O promotor acabou desistindo do processo envolvendo o Portal AZ.

Processos contra jornalistas
Francisco de Jesus Lima processou também os jornalistas Edigar Neto e Jaqueliny Siqueira do G1 PI, e Francisdione Sousa, do Portal 180graus.

Segundo a ação movida contra o G1 PI, a matéria foi divulgada no dia 24.jun.2019, quando o caso não estava sob segredo de justiça. O promotor justifica a ação tendo em vista o arquivamento das investigações, bem como a revogação das medidas protetivas e pela não atualização da matéria declarando sua inocência. A audiência de conciliação só deve acontecer em 2022.

Foto: Divulgação

Procurada pela Abraji, Jaqueliny Siqueira afirmou que não havia motivo para a exclusão da reportagem. “Ele me processou, porque sou gerente de conteúdo do site. A assessoria de comunicação dele entrou em contato comigo por diversas vezes pedindo que a gente excluísse o conteúdo […]. Diante da recusa, ele acabou me processando”, conta Siqueira.

Em 11.mar.2021, a Justiça condenou em primeira instância o jornalista Francisdione Souza e o Portal 180graus a pagarem uma indenização de 4 mil reais ao promotor. Segundo a sentença, o magistrado considerou que ambos expuseram a imagem do promotor de forma indevida, “causando-lhe constrangimentos e dissabores perante a sua família e colegas de trabalho”.

Casos recentes
No dia 7.jun.2021, o promotor fez uma declaração nas redes sociais contra o jornalista Rômulo Rocha, do Portal 180graus. Rocha é o autor da matéria citada no processo. O promotor afirma em seu perfil do Facebook que não irá se intimidar com as “publicações distorcidas” do jornalista e que Rocha “foge das ações penais que tramitam contra si”, ressaltando uma possível condenação somando mais de oito anos de prisão.

Em 2018, Rômulo Rocha apresentou denúncia contra o promotor ao Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) por “haver suspeitas de possível advocacia administrativa, prevaricação, corrupção passiva e abuso de autoridade, em meio à suposta prática de tráfico de influência e corrupção ativa”.

A denúncia resultou em um processo administrativo disciplinar contra Francisco de Jesus Lima, mas o caso foi arquivado um ano depois. Em março de 2021, o promotor entrou com uma ação por denunciação caluniosa em razão da denúncia feita por Rômulo Rocha ao CNMP.

O promotor também processou o jornalista por injúria e difamação referente a mais sete reportagens assinadas por ele. Rocha informou à Abraji que não cometeu nenhum crime contra o promotor.

De acordo com a Constituição Federal, nenhuma lei conterá dispositivo que possa constituir embaraço à plena liberdade de informação jornalística em qualquer veículo de comunicação social (art. 220, caput e §1º, da Lei Fundamental). Resguardar o sigilo da fonte quando necessário ao exercício profissional também é um direito assegurado pela lei (art.5, inciso XVI).

Promotor nega acusações de censura
Procurado pela Abraji, o promotor afirmou que não buscou censurar os veículos de imprensa, apenas exerceu o “sagrado direito de recorrer ao Judiciário para combater excessos, com divulgações de dados de processo que tramitavam em segredo de justiça, que inclusive resultaram em absolvições”.

O promotor também ressaltou que, com exceção do 180graus e do G1, “os outros portais, ao tomarem conhecimento do erro, procuraram o autor, retirando a matéria do ar e, conjuntamente, formularam desistência da ação”. Por fim, declarou que o jornalista Rômulo Rocha revela inconformismo referente à denúncia contra ele instaurada.

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