Senado conta com maioria na CCJ para aprovar fim da reeleição
Com 16 dos 27 titulares favoráveis à proposta, criticada pelo presidente, texto não deve ter dificuldades de avançar.
Iniciativa que tem a oposição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o fim da reeleição para cargos no Executivo tem caminho livre para ser aprovado na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado. Dos 27 titulares, 16 disseram ao GLOBO ser a favor da proibição da recondução de presidentes, governadores e prefeitos, enquanto apenas dois são contra. Esse placar já garante maioria para aprovação de uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) no colegiado.
Entre os favoráveis ao fim da reeleição estão inclusive senadores da base do governo, como Rogério Carvalho (PT-SE). Na semana passada, o líder do governo na Casa, Jaques Wagner (PT-AB), disse que a gestão petista ainda não tem uma “posição tomada” no debate — ele próprio, no entanto, já se disse favorável a acabar com o mecanismo a partir do pleito de 2030.
— Eu sou simpático à ideia do fim da reeleição, com mandato de cinco anos. Mas acho que unificar eleições é ruim para o eleitor — afirmou Carvalho ao GLOBO.
Os presidentes do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), e da CCJ, Davi Alcolumbre (União-AP), definiram que o senador Marcelo Castro (MDB-PI) será relator de uma PEC sobre o tema de autoria do senador Jorge Kajuru (PSB-GO). Eles estiveram no encontro com Lula no Palácio da Alvorada na semana passada e ouviram a opinião contrária do presidente, mas a avaliação geral foi que o assunto precisa avançar na Casa.
Além do fim da reeleição, Castro deve tratar no seu relatório sobre a extensão de mandatos, unificação de datas das eleições municipais, estaduais e nacional e prazo de transição para igualar as datas. Para esta enquete, porém, o GLOBO perguntou aos senadores apenas se eles eram a favor do fim da reeleição, sem entrar nos demais detalhes que devem ser incluídos no relatório.
— Reeleição no país não deu certo, aumenta corrupção e diminui a possibilidade de renovação — disse ao GLOBO o senador Márcio Bittar (União-AC)
A ideia já foi criticada pela presidente do PT, deputada Gleisi Hoffmann (PR), que classificou a iniciativa como “oportunista e retrocesso”. Há críticas também na direita.
— Isso não é prioritário, é manobra diversionista, fuga da realidade. Acho o assunto irrelevante. Qual a finalidade disso? Para mim são temas irrelevantes, reeleição, coincidência de mandatos. Voto contra— afirmou o senador Esperidião Amin (PP-SC) ao GLOBO.
Como forma de responder às críticas, Pacheco tem ressaltado que a medida só valeria a partir de 2030, o que não impediria Lula de concorrer à reeleição em 2026.
A ideia é que o tema seja aprovado pela CCJ até o fim de março. Pacheco quer deixar a PEC como um legado de sua passagem pela presidência do Senado.
Na semana que vem, há previsão de audiências públicas sobre o assunto nas reuniões do colegiado, inclusive com a participação de ex-presidentes da República.
Nesta semana, o ex-presidente Michel Temer defendeu o fim da reeleição em um evento com empresários do Grupo de Líderes Empresariais (Lide) nos Emirados Árabes.
— O Brasil progrediu com a reeleição, mas a esta altura é útil eliminá-la e aumentar o mandato para 5 ou 6 anos— disse Temer a jornalistas presentes no evento.
A impossibilidade de chefes do Executivo serem reconduzidos foi uma promessa de campanha do ex-presidente Jair Bolsonaro na campanha de 2018, embora, ele tenha concorrido à reeleição em 2022. Senadores do PL, no entanto, também querem acabar com a recondução, todos os quatro membros do partido na CCJ disseram ser favoráveis.
— Sou a favor do fim da reeleição, defendo mandatos de 5 anos para todos— disse o senador Magno Malta (PL-ES) ao GLOBO.
Também senador da oposição, o presidente do Progressista, Ciro Nogueira (PP-PI) defende a proibição da reeleição e critica o uso da máquina pública para a recondução de políticas. O partido dele é o mesmo do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e tem uma bancada de 50 deputados e de 6 senadores.
— O Brasil não criou mecanismos suficientes para coibir o uso da máquina em uma reeleição— disse Ciro ao GLOBO.
Não prevista na Constituição de 1988, a reeleição no Executivo foi aprovada em 1997 pelo Congresso, com apoio do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (FHC), o primeiro a se reeleger desde a redemocratização.
Em 2015, a Câmara aprovou seu fim, em uma PEC relatada pelo ex-presidente da Casa Rodrigo Maia, mas o texto não avançou no Senado.
Em 2022, 20 governadores tentaram a reeleição e 18 conseguiram. Na última disputa municipal, em 2020, 1.600 prefeitos foram reeleitos. Na Presidência da República, desde que a reeleição foi instituída, todos os presidentes voltaram ao poder após o primeiro mandato, com a exceção de Bolsonaro.
Símbolo da instituição da reeleição, FHC se arrependeu. “Cabe aqui um ‘mea culpa'”, escreveu em um artigo publicado pelo jornal “Estado de São Paulo” no dia 6 de setembro de 2020. “Permiti, e por fim aceitei, o instituto da reeleição […]. Sabia, e continuo pensando assim, que um mandato de 4 anos é pouco para ‘fazer algo’. Tinha em mente o que acontece nos Estados Unidos. Visto hoje, entretanto, imaginar que os presidentes não farão o impossível para ganhar a reeleição é ingenuidade”.
— A reeleição em alguns lugares tem sido muito maléfica. O cara usa a estrutura do governo para se reeleger, mete os pés pelas mãos — afirmou o senador Omar Aziz (PSD-AM) ao GLOBO.